Aulas de (des)preparação para o parto
Durante estes sete meses tenho lido muito sobre o parto, o nascimento, os bebés. Tenho tentado manter-me informada e ser realista. Conheço a teoria tanto por falar com pessoas que já passaram por lá (em especial a minha mãe que tem sido impecável e me conta de uma forma realista, não dramatizadora nem alarmista, como decorre o parto). Conheço as "fases do trabalho de parto", sei que pode durar muitas e muitas horas e em média dura 12 horas (para mães em primeira vez). 12 horas essas que não são todas de grande sofrimento, mas que no final se passam ali uma horitas muito difíceis (quando a dilatação vai entre os 8 e os 10 centímetros), com contracções muito intensas de dois em dois minutos, com a mesma duração, mais ou menos, sei que o mais provável é que me cortem e que eu sofra depois com a suturação e a cicatrização. Sei tudo isso. Sei perfeitamente que se sofre no parto, mas também sei, pelo que li, que existem formas, hoje em dia, de atenuar um pouco todo o sofrimento. Existe a epidural, existem cuidados especiais, existe humanismo (nem sempre), existe a possibilidade do pai estar presente na sala (o que, na maioria das vezes, ajuda ao auto-controlo), e existem os "exercícios" de auto-controlo, pela respiração e não só (que é o que pretendo aprender). Não é muito, mas é alguma coisa. Ou pensei eu que existia tudo isso em todo o lado e por me sentir preparada psicologicamente para enfrentar tudo isso, estive relativamente calma até agora (até porque já sofri muito em hospitais, em termos de dor física por causa de um acidente que tive, mas tudo foi muito atenuado pelo cuidado com que me trataram).
Porém, hoje na minha aula de preparação para o parto, fiquei a saber que aqui (onde, pensava ter a Beatriz), não existe nada disso. Fiquei a saber que existe a mentalidade do "a mulher tem de sofrer" e do "fizeste-o e gostaste agora aguenta" e que, por esse motivo existe a recusa de se dar epidural às mulheres em trabalho de parto. Não há sequer a possibilidade do papá estar presente (por enquanto, e provavelmente em Novembro ainda não haverá). Ou seja, é um pouco o "salve-se quem puder" e o "manda lá isso cá para fora e depressinha porque nós não temos tempo, e os anestesistas têm mais que fazer do que aturar mulheres aos gritos". Assim como quem não quer a coisa a fisioterapeuta que nos prepara insinuou que, se pudermos, nos devemos dirigir ou a Coimbra ou a Lisboa (ambas ficam mais ou menos à mesma distância).
É conhecida (para quem me conhece) a minha preferência pela cidade. Pela vida na cidade. Porém isso acontece muito mais por uma questão de mentalidade do que por qualquer outra. Infelizmente a falta de humanidade, de entendimento humano e compreensão pelo outro, cuidado com o outro, é muito evidente aqui (na província). Não pensei que isso existisse também nos cuidados de saúde (apesar de nunca me terem tratado com sorrisos sempre que vou ao hospital), talvez andasse a tentar mentalizar-me que no hospital as coisas fossem diferentes. Infelizemente aqui as pessoas confundem compreensão e preocupação pelo outro com intromissão na vida alheia. E infelizmente existe, e vai continuar a existir, a mentalidade do "eu passei por isso, portanto também tens de passar... se a mim as coisas não foram facilitadas, a ti também não podem ser". Nota-se isso nas questões da passagem pela adolescência (quais dermatologistas para se tratar o acne juvenil? "é normal... eu também passei por isso"), nas questões de saúde mental e por cá os níveis de depressão e suicídio são mais elevados do que na cidade, mas tratar uma depressão? "isso é coisa de malucos", e nas questões de saúde e dor física onde incluo o parto. É a lei do "se eu sofri, porque carga de água hei-de minimizar o sofrimento do outro?".
É isto que eu sinto aqui. Sinto esta falta de compreensão e preocupação, falta de corrigir na vida dos outros aquilo que nos custou a nós e sinto, ainda por cima, uma intromissão sufocante na vida alheia (como se isto fosse um grande (ou se calhar pequeno) Big Brother). Enquanto só conheci esta realidade para mim isso também era normal (apesar de nunca ter compactuado com ela, mas aceitava-a como normal), deixou de ser a partir do momento em que saí daqui para ir morar para o Porto e senti a diferença, diferença essa ainda mais sentida em Lisboa (onde a mentalidade é ainda mais de cidade: de menos intromissão e de uma maior tentativa de melhoramento de cuidados). A cidade pode ter muitos defeitos e muitos mais perigos do que a província, mas tem vantagens que compensam tudo isso.
E pronto, já desabafei.
Já agora, em Lisboa (se eu puder ir para lá), que hospital acham melhor em termos de cuidados de parto (hospital publico)?
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